A obesidade é uma condição multifatorial que afeta milhões de pessoas em todo o mundo.
Pessoas com o mesmo índice de massa corporal (IMC) podem apresentar causas e padrões comportamentais distintos relacionados ao ganho e à manutenção do peso.
Tradicionalmente, o tratamento da obesidade tem sido baseado em abordagens gerais e inespecíficas. No entanto, pesquisas recentes sugerem que o reconhecimento do tipo (fenótipo) da obesidade e tratamento direcionado permitem uma abordagem mais precisa e eficaz no manejo do excesso de peso, aumentando as chances do paciente perder peso.
Seguem abaixo de forma pormenorizada os 4 tipos (fenótipos) da obesidade.

1. Comer Emocional (Emotional Hunger)
Refere-se ao ato de comer motivado por emoções (apetite hedônico), ao invés da fome fisiológica. Esse comportamento está associado ao consumo de alimentos em resposta a emoções positivas ou negativas. Alimentos ricos em açúcar e gordura são frequentemente escolhidos nesses momentos devido ao prazer imediato que proporcionam.
Características:
- Comer em resposta a emoções (ansiedade, tristeza, tédio, estresse).
- Desejo por alimentos hiperpalatáveis (ricos em açúcar, gordura e sal).
- Padrões alimentares desorganizados.
Estratégias terapêuticas:
- Terapia cognitivo-comportamental: foco na identificação e modificação de gatilhos emocionais para a alimentação.
- Mindfulness e meditação: técnicas para reduzir o estresse e melhorar o controle emocional.
- Estabelecimento de rotina alimentar: horários fixos para refeições e lanches para reduzir o comer impulsivo.
- Medicamentos: podem ser necessários para compulsão, como por exemplo o uso de bupropiona.
2. Cérebro Faminto (Hungry Brain)
Caracteriza-se por uma percepção alterada de saciação (quantidade de calorias necessárias para se sentir satisfeito). A pessoa precisa de mais calorias para terminar uma refeição. Indivíduos com esse perfil têm dificuldade em reconhecer quando estão satisfeitos, levando ao consumo excessivo de alimentos.
Fatores como desequilíbrios hormonais, com alterações nos níveis de grelina e leptina, podem influenciar essa percepção distorcida de saciação.
Características:
- Dificuldade em perceber a saciação.
- Maior ingestão calórica em uma única refeição.
- Desequilíbrios hormonais.
Estratégias terapêuticas:
- Terapia cognitivo-comportamental: para aumentar a consciência alimentar e reduzir o comportamento automático de comer até “se sentir cheio”.
- Mindful eating: práticas de atenção plena durante as refeições para identificar sinais de saciação sutis.
- Divisão das refeições: fracionar a alimentação em porções menores e mais frequentes pode ajudar a modular os sinais de saciação.
- Medicamentos: que atuam de forma indireta nos hormônios da grelina e leptina (ex: sibutramina).
3. Intestino Faminto (Hungry Gut)
O problema aqui reside na percepção de saciedade (intervalo entre acabar de comer e voltar a sentir fome). Indivíduos com esse perfil sentem fome rapidamente após as refeições, levando a um consumo frequente de alimentos.
Essa condição pode ser influenciada por alterações na liberação dos hormônios gastrointestinais, como GLP-1 e PYY, que influenciam a saciedade.
Características:
- Fome excessiva pouco tempo após as refeições.
- Disfunção nos hormônios de saciedade pós-prandial (como GLP-1, PYY).
- Maior motilidade gastrointestinal e esvaziamento gástrico acelerado.
Estratégias terapêuticas:
- Aumento do teor de fibras e proteínas: esses macronutrientes promovem maior tempo de saciedade.
- Evitar refeições líquidas ou altamente processadas: que são digeridas rapidamente.
- Medicamentos: que retardam o esvaziamento gástrico (ex: semaglutida, liraglutida e tirzepatida).
4. Metabolismo lento (Slow Burn)
Refere-se a uma redução na taxa metabólica basal, resultando em menor gasto energético diário. Pessoas com esse fenótipo queimam menos calorias mesmo em repouso, o que contribui para o acúmulo de gordura corporal ao longo do tempo.
Essa redução pode ser influenciada por fatores como envelhecimento, predisposição genética, alterações hormonais ou mesmo adaptações metabólicas após perda de peso significativa.
Características:
- Taxa metabólica basal reduzida.
- Maior dificuldade de perda de peso mesmo com dieta hipocalórica.
- Fadiga e resistência para realizar exercício físico.
Estratégias terapêuticas:
- Treinamento de força/resistência: exercícios que aumentam a massa muscular elevam o metabolismo basal.
- Atividade física regular: mesmo atividades leves podem melhorar o gasto calórico total.
- Terapia hormonal, quando indicada: para casos com alterações hormonais associadas (como hipotireoidismo ou menopausa).
- Alimentos termogênicos: podem ser aliados na aceleração do processo metabólico e na queima de gordura. Alguns dos principais alimentos termogênicos incluem pimenta vermelha, chá verde, gengibre, canela e café.
Conclusão
Compreender os diferentes tipos (fenótipos) da obesidade é crucial para a realização de tratamentos personalizados.
Um mesmo indivíduo pode combinar mais de um fenótipo. A identificação do(s) fenótipo(s) predominante(s) permite a escolha de intervenções específicas, aumentando as chances de sucesso no tratamento. Ao abandonar a ideia de “dieta única para todos” e focar nas necessidades específicas de cada indivíduo, profissionais da saúde podem oferecer abordagens mais empáticas, eficazes e sustentáveis.
O tratamento eficaz da obesidade está na personalização e reconhecer os fenótipos é um dos caminhos mais promissores nessa direção.
Referências
- BRAY, George A.; RYAN, Donna H. Obesity: A chronic relapsing progressive disease process. Endocrine Practice, [S.l.], v. 27, n. 5, p. 479–486, 2021. DOI: https://doi.org/10.1016/j.eprac.2021.03.010
- FARIA, S. L.; FARIA, O. P.; CARDEAL, M. de A.; ITO, M. K. Obesity phenotypes: behavioral and psychological aspects and treatment strategies. Diabetes, Metabolic Syndrome and Obesity: Targets and Therapy, [S.l.], v. 3, p. 261–270, 2010. DOI: https://doi.org/10.2147/DMSOTT.S10615
- APOVIAN, Caroline M. et al. Pharmacological management of obesity: An endocrine society clinical practice guideline. The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism, [S.l.], v. 100, n. 2, p. 342–362, 2015. DOI: https://doi.org/10.1210/jc.2014-3415
- MAURO, M.; TAYLOR, V.; WHARTON, S.; SHARMA, A. M. Barriers to obesity treatment. Canadian Family Physician, Mississauga, v. 54, n. 4, p. 500–506, 2008. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2294190/
- RAVUSSIN, Eric; BOGARDUS, Clifton. Energy balance and body weight regulation: a tale of two components. Diabetes, [S.l.], v. 49, n. 9, p. 1472–1479, 2000. DOI: https://doi.org/10.2337/diabetes.49.9.1472